Nasci no final da década de 1970 e cresci nos anos 1980 e 1990, uma época em que muita coisa era dita e feita sem questionamento. O mundo era outro: sem internet, sem redes sociais, sem o fácil acesso à informação que temos hoje. E eu, como qualquer criança daquela época, aprendi os valores que me foram passados pelos meus pais, que, por sua vez, herdaram dos deles.
Costumo dizer que faço parte de uma geração de transição. Meus pais nasceram na década de 1940, meu filho em 2010. Entre nós, há um fosso de mudanças sociais, culturais e tecnológicas. Se para eles certas ideias eram normas inquestionáveis, para mim essas mesmas ideias começaram a fazer menos sentido. E agora, como mãe, minha missão é garantir que meu filho cresça sem carregar preconceitos e tabus que simplesmente não cabem mais no mundo de hoje.
Livre de preconceitos: deixando para trás valores que não fazem sentido
Quero deixar uma coisa bem clara: minha intenção de forma alguma é culpar meus pais pelo que me ensinaram! Apesar de algumas coisas não se adequarem ao mundo em que crio Luca, os valores da educação e da gentileza (para citar alguns) que aprendi passarão para o meu filho e para as nossas gerações futuras.
Sei que eles fizeram o melhor com o que tinham e com as informações que lhes eram apresentadas. Contudo, sei também que é minha responsabilidade agora quebrar os ciclos que destoam da realidade dessa geração e preparar meu filho para viver em uma sociedade que valoriza o respeito, a diversidade e a empatia.
Diversidade dentro de casa!
Uma das formas mais eficazes de combater preconceitos é por meio da exposição e do exemplo. Desde pequeno, procuro apresentar a Luca uma variedade de pessoas, famílias e histórias que reflitam o mundo real. Lemos livros com personagens diversos, assistimos a filmes e séries que mostram diferentes culturas e formas de amor. A ideia é que a diversidade não seja vista como exceção, mas como parte natural da vida.
Outra coisa que sempre considerei muito positiva em nossa própria família é a diversidade racial. Luca tem uma avó loira de olhos claros (minha mãe) e uma avó negra (minha sogra). Essa mistura é parte da identidade dele e, dentro de casa, a pluralidade de tons de pele nunca foi uma questão. Para ele, sempre foi natural que as pessoas sejam diferentes entre si e que, acima de qualquer cor, o que importa é o amor que elas oferecem.
Nunca houve, dentro da nossa dinâmica familiar, a ideia de que uma avó era melhor que a outra por conta da cor da pele. Muito pelo contrário: ambas são fontes inesgotáveis de carinho e afeto. Luca vem crescendo cercado por esse amor e, com isso, desenvolveu desde cedo um olhar natural para essa diversidade.
Vale salientar também que, embora eu e Rodrigo tenhamos a pele bem clara, Luca nasceu “doce de leite”. Além da família da avó paterna, também trago do meu lado a ascendência negra por parte de pai. Essa mistura, que está registrada na cor da pele dele, nunca foi tratada como um tabu, e isso reflete na maneira como ele enxerga o mundo: com respeito, naturalidade e com zero espaço para preconceitos.
Desconstruindo preconceitos cotidianos
O preconceito – seja em qual forma for – nem sempre se apresenta de forma escancarada. Muitas vezes, está nos detalhes do dia a dia. Comentários como “isso é coisa de menina” ou “homem não chora” são pequenos reforços de ideias ultrapassadas. Sempre que me deparo com situações assim, aproveito para explicar a Luca que sentimentos não têm gênero, e que todos têm o direito de expressar suas emoções sem medo.
Da mesma forma, quando vemos situações de discriminação, seja em notícias ou no nosso próprio convívio, conversamos sobre por que aquilo está errado e como podemos agir para mudar. Ensinar meu filho a se posicionar diante de injustiças é parte do processo de formação de um adulto consciente e solidário.
Outro ponto importante é não adoçar a realidade. Embora seja doloroso reconhecer que o mundo ainda é hostil para muitas pessoas, esconder isso de uma criança não é uma opção. Em vez disso, ensino Luca que ele pode ser parte da mudança, sendo uma pessoa acolhedora e combatendo atitudes discriminatórias.
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Criando um espaço seguro para dúvidas e reflexões
Outro aspecto fundamental é permitir que Luca pergunte sem medo. Quando uma criança não tem espaço para questionar, ela busca respostas em lugares nem sempre confiáveis. Prefiro que ele traga suas dúvidas para mim e que possamos discutir abertamente sobre qualquer tema, seja racismo, LGBTQIA+, gênero ou religião.
Não importa se ele crescerá concordando comigo em tudo. O que importa é que ele desenvolva pensamento crítico e saiba que pode conversar com os pais sem medo de reprimendas. Criar um filho livre de preconceitos é um processo contínuo, e eu mesma continuo aprendendo nesse processo chamado maternidade. Mas se tem algo de que tenho certeza é que a base de tudo é o respeito.
O mundo mudou muito desde que eu era criança, e meu papel como mãe é ajudar meu filho a crescer com valores que reflitam essa nova realidade. Se fizermos nosso trabalho direito, talvez a próxima geração nem precise ter essa conversa.